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Crítica – Ato II: Recital Instrumental (Baiana System)

Foto do escritor: Pedro GusavaquiPedro Gusavaqui



Empenado. Erudito. Soturno. Assim descrevo em três palavras o Ato II: Recital Instrumental, do projeto OxeAxeExu, do grupo Baiana System.


A Bahia é tradicionalíssima em movimentos artísticos instrumentais. Tão mais regozijantes, dada a visibilidade, são hoje em dia. O mestre Letieres Leitte e sua Orquestra Rumpilezz; a Orquestra Afro Sinfônica da Bahia; o rico Jam no MAM e seus mais de 20 anos de existência, como um todo; as filarmônicas do Recôncavo Baiano, o grupo Afrocidade; OSBA; enfim, a Bahia é potência e referência na contação de história sem o uso do lexema.

O disco OXEAXEEXU é um projeto iniciado no período pandêmico, que visa transportar os tripulantes desse grande navio pirata aos recônditos, ou nem tanto assim, sentimentos da folia carnavalesca que o Baiana sabe muito bem fazer.


Dividido em três atos: Navio Pirata, Recital Instrumental e América do Sol, mais uma vez o sistema baiana habita o poder do discurso e da reflexão desse tempo hodierno (e por que não odioso) a que pertencemos todos. Apesar do discurso ser, literalmente, não tão bem ouvido no Ato I, o navio pirata tende a acalmar-se em águas tempestuosas pronto a dizer mais.


Na sua primeira faixa, Tubarão, entende-se o porquê de esse ser um álbum, essencialmente, instrumental. As construções onomatopeicas, de rápida assimilação e repetitivas, são floreios ante a vivacidade do tocar de seus músicos. Não é a parte principal; antes, uma parte do todo. Isso tem um apelo de chamamento popular. Se é o objetivo? Pouco importa. A mente já se conecta à erudição. Barbatana é uma imediata continuação. Emerge da cultura moura e do alto das eletrohouses europeias dos anos 2000. Em Criado Mudou, a erudição pressuposta na primeira faixa consolida-se de vez, visto que o maestro, arranjador, compositor e pianista, Ubiratan Marques, é vez e voz instrumental da peça. Aqui, novamente, a palavra, enquanto código léxico, é deixado em segundo plano, no qual o toque, a sonoridade e o ato encarregam-se de movimentar a história.


Rádio África é dançante e gera conexão instantânea em quem é ouvinte assíduo da Rádio Educadora e de seu programa homônimo ao fonograma.


O ápice do arranjo suspenso, levitante, que toca no âmago e finaliza a temática linear proposta pelo Recital Instrumental, é Guerra Batalha. Com participação primorosa de Liz Reis, mezzo soprano da Orquestra Neojibá, a faixa aponta numa direção de esperança, que flerta com o Funk setentista e oitentista americano, mas brasileiro nos caminhos melódicos do arranjo.

É Simonal em cerne. Toques de trombeta prenunciam um estado superior de paz. Seus sopros são o coro da palavra subtextual.


A obra é assinada por muitas mãos, assim como o próprio sistema baiana o é. Produção de SekoBass em Tubarão, com flautas e sax de Joander Cruz; de Junix 11 em Barbatana (e é seu one man band, também); de Daniel Ganjaman, que adiciona mais e mais camadas às muitas camadas do Maestro Ubiratan, em Criado Mudou; de Cássio Calazans em Rádio África (e a conexão intercontinental com o DJ Sankofa, radicado em Salvador e integrante do programa homônimo na Educadora FM). Guerra Batalha fecha o Ato II com arranjo do Maestro Ubiratan e João Teoria, Rudnei, Gilmar Chaves, Franclin, Nilton e Vinícius Freitas compondo a extensão dos metais.


Acertaram. O saldo deste ato é positivo, no fim. A constatação é a seguinte: a realidade é empenada. É preciso navegá-la.


Nota: 3 acarajés e um abará

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